26 mar Remédio contra burocracia
Câmara vota projeto de lei que acaba com entraves para importação de bens para pesquisa.
Já é rotina nos laboratórios brasileiros: a burocracia emperra durante meses a importação da tecnologia necessária para pesquisas e impede o lançamento de trabalhos inéditos.
Mas este cenário pode passar por uma reviravolta a partir de amanhã, quando a Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara de Deputados votará um projeto que prevê a importação de insumos para pesquisas cientificas e tecnológicas sem pagamento de impostos ou qualquer entrave burocrático.
Um levantamento realizado em 2010 pelo Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias da UFRJ mostrou que 99% dos cientistas precisam importar equipamentos e materiais perecíveis, os reagentes.
A imensa maioria (92%) espera pelo menos um mês para a chegada dos insumos.
Nos EUA e nos países europeus os produtos são entregues em um ou dois dias.
Tem muita gente esperando por avanços nessa área destaca a deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP), relatora do projeto de lei. Vamos ter que dar um voto de confiança aos nossos pesquisadores.
CAMUNDONGOS BARRADOS
Poucos anos atrás, Mayana Zatz, diretora do Instituto Nacional de Células-Tronco em Doenças Genéticas da USP, importou oito camundongos, dois casais e seis filhotes, para estudar distrofias musculares.
Mas a fêmea deu à luz outros quatro e, por isso, os animais foram retidos ao chegar no país.
Afinal, só havia autorização para que oito roedores chegassem ao Brasil.
Demorou uma semana até que o impasse fosse resolvido. É um pequeno episódio que mostra o tamanho dos obstáculos a um trabalho.
Preciso assinar quatro ou cinco papéis para dar entrada à importação de qualquer reagente lamenta. Muitas vezes, estes materiais não comprovam nossas pesquisas, então precisamos fazer solicitação para outros reagentes, e o drama se repete.
Neurocientista e professor do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ, Stevens ReRehen coordenou enquetes sobre como a burocracia afeta a pesquisa brasileira.
O questionário hoje é respondido por apenas 60 questionados já foram 300. Para Rehen, tratase de um sinal de como seus colegas estão descrentes em qualquer mudança de rumo.
Para mandar ou receber células de outros países, precisamos contratar uma empresa, e esta operação custa mais do que o material que estudamos queixa-se.
Até percebemos uma sensibilidade no alto escalão, mas isso não chega ao funcionário da alfândega.
Lygia da Silva Pereira, professora do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias da USP, ressalta que a burocracia paralisa as pesquisas e mancha a reputação da ciência brasileira no exterior.
Já devolvemos materiais a outros países porque eles ficaram meses aqui sem que conseguíssemos levá-los ao laboratório lembra.
Não estamos pedindo mais dinheiro do governo, e sim mecanismos para trabalhar para ele, que é nosso financiador.
Ele cria uma série de dificuldades que não nos deixa produzir o que somos capazes. É um tiro no pé.
De acordo com a pesquisadora, o país tem a capacidade intelectual de Primeiro Mundo, mas apoio administrativo e legal de Terceiro Mundo. Com isso, alguns cientistas fizeram as malas e levaram seus estudos para países em que recebem mais investimentos.
É o caso de Alysson Muotri, biólogo molecular e professor da Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia.
A visão de que o material de pesquisa precisa ser taxado e controlado é retrograda e vai contra os interesses do país protesta
. Foi preciso um jogador famoso de futebol ter uma filha com uma doença grave para que isso seja discutido acrescenta, referindo-se ao deputado Romario (PSB-RJ), autor do projeto, e sua filha Ivy, portadora da Síndrome de Down.
O projeto de lei terá ainda que passar pelas comissões de Ciência e Tecnologia e de Constituição e Justiça. A partir dai, seguiria direto para o Senado, sem passar pelo plenário da Câmara.
Fonte: O Globo
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