18 maio ARTIGO – Sobre o veto da Presidenta Dilma à venda de medicamentos, em supermercados
O Diário Oficial da União (DOU) de hoje (18.05.12), em sua página 3, seção 1, traz publicado o que é a tradução do bom senso: o veto da Presidenta da República, Dilma Rousseff, à venda de medicamentos isentos de prescrição em supermercados, armazéns, empórios e lojas de conveniência. Não se esperava outra atitude de Dilma Rousseff que não o veto ao artigo 8º do Projeto de Lei de Conversão número 7, de 2012 (MP número 549/11). O referido artigo instituía a aberração de tirar das farmácias e drogarias, e levar para estabelecimentos que nada têm a ver com a saúde, produtos destinados exclusivamente à manutenção e recuperação da saúde. Medicamentos, pela complexidade de sua natureza química e biológica, devem ser abrigados com todos os cuidados e só as farmácias estão qualificadas para tanto -, e sua dispensação somente pode ser realizada com o acompanhamento do farmacêutico.
O não da Presidenta Dilma desata um nó que, durante 23 dias (período em que o PLC número 7, aprovado no Senado, foi encaminhado para a sanção ou veto presidencial) gerou debates e causou perplexidade entre autoridades sanitárias, farmacêuticos, empresários do setor e a sociedade em geral, temerosos que estavam com o iminente perigo que voltava a rondar a saúde dos brasileiros.
Mas o veto consolida a lógica e o bom senso e reitera todos os protocolos sanitários e o conjunto normativo segundo os quais o lugar de medicamentos é nas farmácias e sob a responsabilidade técnica do farmacêutico. Até porque o veto presidencial foi amparado pela unanimidade da opinião de todos os Ministérios ouvidos por Dilma Rousseff: Saúde, Justiça, Fazenda, Desenvolvimento, Indústria e Comercio Exterior.
No Despacho publicado, nesta sexta-feira, no DOU, a Presidenta Dilma comunica ao Presidente do Senado Federal que decidiu vetar o artigo 8º do Projeto de Conversão número 7 de 2012 (MP número 549/11), por contrariedade ao interesse público. Ela justifica assim o veto: A ampliação da disponibilidade de medicamentos nos estabelecimentos em questão dificultaria o controle sobre a comercialização. Ademais, a proposta poderia estimular a automedicação e o uso indiscriminado, o que seria prejudicial à saúde pública.
A MP 549/11 é uma matéria de grande alcance social. Ela isenta do pagamento do PIS/Pasep e Cofins 22 produtos destinados a pessoas com deficiência. Mas quando tramitou, na Câmara, a Medida Provisória ganhou um dispositivo (o artigo 8º) do Deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), autorizando a venda de produtos farmacêuticos fora das farmácias e drogarias. O artigo 8º nada tem a ver com a MP e foi posto, ali, pegando uma carona numa MP pura e avançada. No Senado, ela foi aprovada e levou a denominação de MP 549-B.
A MP, como estava (com a inclusão do artigo 8º) significava um retrocesso que negava todas as políticas públicas instituídas na área da saúde, como o combate à automedicação e ao uso irracional de medicamentos, responsáveis por um número assombroso de casos de intoxicação e outros agravos à saúde.
Ora, o brasileiro figura entre os povos que mais se automedicam, em todo o mundo. Que proporção tomaria esse perigo, se os medicamentos fossem oferecidos, em estabelecimentos puramente comerciais, fora do controle sanitário e na ausência do farmacêutico, o profissional responsável pela orientação sobre o uso correto desses produtos? Seria uma catástrofe sanitária. E que fique claro: a venda de medicamentos, em armazéns e supermercados, só teria um objetivo: atender ao interesse econômico.
Se fosse sancionada a MP com o artigo 8º, o que veríamos, no Brasil, seria a farra do interesse em cima da saúde do povo brasileiro, que seria induzido a comprar medicamentos pelas elaboradas campanhas publicitárias do tipo leve três e pague dois. O resultado seria o aumento dos casos de intoxicação e as decorrentes hospitalizações evitáveis que tanto oneram os sistemas público e privado de saúde.
Há uma ideia equivocada, construída pela voraz gana mercadológica e muito bem plantada na cabeça do cidadão, de que medicamentos isentos de prescrição não fazem mal. São um mito e uma afirmação nociva e leviana que precisam ser desconstruídos. Não há um único medicamento mesmo um analgésico desses mais usados – que não possa provocar reações adversas, em maior ou menor grau. O medicamento é isento de prescrição, mas não de riscos.
A venda desenfreada de medicamentos iria onerar o já sacrificado orçamento dos cidadãos, tentados que seriam a adquirir esses produtos, muitas vezes, desnecessariamente. Ressalte-se, ainda, o iminente perigo de se banalizar a sua venda, por meio de sua transformação em mercadorias sujeitas exclusivamente às normas de mercado e não de saúde , além de sua exposição às estratégias de venda. Afinal, iriam perder o sentido de produto destinado à recuperação da saúde para servir unicamente ao mercado.
De sorte que a Medida Provisória, do jeito que estava, enfraqueceria a elogiável política sanitária que o Governo Federal vem implantando. Parte dessa política está instituindo o descarte correto de medicamentos, por meio da implantação da logística reversa, que consiste em as farmácias e as drogarias receberem dos pacientes os medicamentos vencidos ou as sobras destes, e lhes dar a destinação final correta. Agora, imagine se um armazém, um empório e um supermercado iriam agir, como agirão as farmácias, realizando o descarte correto de medicamento.
Desde que a MP foi aprovada, no Senado, e encaminhada à Presidência da República, procurei as autoridades políticas, sanitárias, lideranças farmacêuticas e diretores de entidades (Conselhos Regionais de Farmácia, sindicatos farmacêuticos, a Federação Interestadual de Farmacêuticos Feifar, a Federação Nacional de Farmacêuticos Fenafar, entre outras), com vistas a sensibilizar a Presidenta Dilma para que vetasse o artigo 8º, plantado clandestinamente na Medida Provisória, ou posto, ali, como uma barriga de aluguel, como diz um outro jargão igualmente usado entre os que lidam no dia-a-dia da política, em Brasília, para se referir a atitudes como a do Deputado Sandro Mabel. A nossa luta serviu para medir o quanto o setor farmacêutico está unido em favor da preservação da saúde da população.
Não é de hoje que o interesse econômico tenta agredir a saúde pelos mesmos meios. Em 1996, igual perigo deixou atônito o setor de saúde, com o Projeto de Lei número 4.385/94, de autoria da Ex-Senadora Marluce Pinto. O PL dava ao auxiliar de farmácia a responsabilidade técnica pelas drogarias, tirando do farmacêutico a exclusividade pela mesma.
Esta nova tentativa de impor uma derrota à saúde pública, desferindo um golpe no setor farmacêutico, serve para que fiquemos muito atentos às manobras do interesse econômico. Ele é sorrateiro e age, muitas vezes, subterraneamente. Não podemos afrouxar a vigilância, nem perdermos esta voltagem de união, imprescindível nesta vitória de hoje.
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